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alergia e cotidiano
leite materno e alergias

alergia e amamentação

Uma pergunta muito comum de mães alérgicas com filhos recém-nascidos é se a sua alergia é capaz de passar para o filho, seja de forma genética ou seja durante a gravidez, por meio da placenta, ou mesmo no período após o nascimento, durante a amamentação. Outra pergunta é, de certa forma, o contrário: se o leite materno é capaz de proteger o bebê das alergias. Para podermos entender essa questão, vamos primeiro entender o conceito da doença alérgica e como ela pode surgir nos bebês recém-nascidos.

o sistema imunológico do bebê e a "Hipótese da Higiene"

O termo alergia foi descrito no começo do século XX, por um pediatra que observou que o nosso sistema de defesa do corpo, o imunológico, pode reagir a elementos estranhos, desde micróbios até substâncias inofensivas, de duas formas opostas: protegendo-se ou exagerando na resposta, gerando diversos sintomas indesejáveis. Nesse processo, o sistema de defesa identifica um alérgeno — como pólen, pelos de animais, certos alimentos ou medicamentos — como uma ameaça. Quando o alérgeno reaparece, para combatê-lo, o organismo produz um anticorpo chamado de IgE (ou do tipo E), que a princípio é protetor, mas que acaba sendo o principal responsável pela resposta intensa e inadequada, já que ele promove a produção e disseminação de histamina e outras substâncias que geram, diretamente, os sintomas ruins, que variam de uma simples coriza a crises graves, como faltas de ar, inchaços (angioedemas) e urticárias.

Os bebês são bastante susceptíveis a alergias, pois os órgãos e o sistema de defesa dos pequenos ainda estão em formação, podendo levar, facilmente, a estas respostas imunológicas exageradas. As vias respiratórias dos bebês, por exemplo, são mais estreitas do que os dos adultos, entupindo mais facilmente e podendo levar a crises frequentes de faltas de ar, chiado, tosse, espirros e coriza. A barreira da pele e do intestino dos bebês também são mais permeáveis nos primeiros meses, tanto que as alergias alimentares e as dermatites atópicas são bem importantes na primeira infância. Na alimentar, os bebês podem apresentar sintomas como cólicas intensas, diarreia, sangue nas fezes; já as dermatites são caracterizadas por manchas vermelhas na pele, coceira e pele seca.

Sabe-se que as alergias possuem um caráter genético importante, ou seja, se um dos pais, ou ambos, possuem a doença, há uma probabilidade maior da criança também apresentar, que não necessariamente será contra o mesmo alérgeno causador da alergia nos pais. Porém, há um outro componente nessa história, essencial para o aparecimento ou não dessas alergias, que chamamos de ambiental. Este está relacionado, principalmente, com a forma que vai se dar o primeiro contato da criança com os alérgenos e, também, com a forma de desenvolvimento do sistema de defesa dos pequenos.

O sistema imunológico já começa a desenvolver no período fetal, durante a gravidez, pois anticorpos protetores vindos da mãe, os do tipo G (IgG), conseguem passar pela placenta e concedem uma pequena imunidade à criança. Porém, é logo após o nascimento que o sistema imune começa a, de fato, amadurecer, principalmente por conta de micróbios bons (os da microbiota) que começam a povoar o intestino e as vias aéreas do bebê. De fato, crianças que crescem em ambientes muito limpos, com menos bactérias, parasitas e fungos, têm maior risco de desenvolver alergias, pois seu sistema imunológico não é suficientemente treinado. Isso é o que chamamos de “hipótese da higiene”.

Em direção oposta, bebês que ficam em contato constante com alérgenos do ar (como poeiras e mofos) e substâncias irritantes (como poluição e fumaça de cigarro) possuem risco aumentado de desenvolver as alergias respiratórias; já bebês que recebem fórmulas de leite de vaca nas primeiras semanas de vida possuem maior propensão a desenvolver alergia a leite de vaca no futuro. Resumindo, a forma de contato do bebê com os alérgenos e a forma de desenvolvimento do seu sistema de defesa vai ser essencial. O leite materno, como veremos a seguir, terá um papel fundamental nisto.

leite materno: em até qual idade ele é necessário?

A teoria mais aceita é que o leite materno funciona como um escudo protetor: ele carrega anticorpos benéficos, especialmente uns de outro tipo, os chamados A (IgA), além de células de defesa e substâncias reguladoras (citocinas, fatores e oligossacarídeos – um tipo de prebiótico) que orientam o desenvolvimento do sistema imune dos bebês e nutrem bactérias benéficas no intestino deles. O leite materno não é estéril, sendo rico destes micróbios bons (probióticos), que vão colonizar a criança nos primeiros meses de vida. Estudos mostram que bebês amamentados exclusivamente por, pelo menos, quatro a seis meses têm níveis mais baixos de IgE e risco menor de alergia ao leite de vaca (menos de 1%).

A introdução de fórmulas a base de leite de vaca, água ou chás nas primeiras semanas causariam uma redução nesses fatores de proteção, podendo vir a aumentar a chance de aparecimento de alergia ao longo da vida do infante. Por isso, autoridades como OMS e UNICEF recomendam aleitamento materno exclusivo até os seis meses, com introdução gradual de outros alimentos a partir dessa idade, por conta da necessidade do bebê por novos elementos, como o ferro e o zinco, porém mantendo o aleitamento por, pelo menos, dois anos.

No contexto da alergia é importante introduzir os principais alimentos alergênicos (como leite de vaca, soja, trigo, ovo, peixe, camarão e amendoim) para o bebê logo entre o período de vida de 6 a 12 meses, mantendo, ao mesmo tempo, o aleitamento materno. Se o bebê estiver apresentando reações alérgicas ao leite materno, essa introdução de outros alimentos deve vir com cuidado extra e junto a uma orientação médica.

De fato, alguns bebês com predisposição genética podem apresentar reações contra alérgenos presentes dentro do leite materno e que foram “transferidos” via amamentação. Proteínas alimentares – como as leite de vaca vindas da dieta da mãe – e até traços de aditivos presentes em alimentos ultraprocessados podem chegar ao leite materno e sensibilizar o sistema imune do lactente. Entretanto, o consenso é que, para a maioria dos bebês, essas proteínas alimentares junto aos anticorpos da mãe ajudam a desenvolver tolerância, ou seja, reduzem o risco de alergia. É, portanto, a forma de contato correta do bebê com os possíveis alérgenos.

Um ponto de atenção é no caso de mães com histórico de atopia (predisposição a desenvolver reações alérgicas), onde é comum encontrarmos, no leite materno, concentrações maiores de substâncias que estimulam a produção de anticorpos ruins do tipo E (IgE) pelo bebê, como certas citocinas ligadas à resposta alérgica. Entretanto, quando colocamos numa balança os prós e contras, a amamentação deve ser mantida em mães alérgicas e mesmo as com sintomas de alergia.

Resumindo, sabemos que a composição do leite varia entre as mães e depende do estilo de vida destas. Mães alérgicas, com alimentação pouco saudável e em uso constante de antibióticos, medicamentos que interferem diretamente na microbiota, podem apresentar um leite materno com uma composição pobre, menos protetora e mais alergênica. É importante que a mãe tenha uma refeição equilibrada e não restritiva, que contenha todos os alimentos potencialmente alergênicos, como leite, ovos, trigo e frutos do mar. As pequenas quantidades desses alimentos que passam pelo leite materno, como vimos, vão ser importantes no desenvolvimento de tolerância do bebê a esses alimentos. A eliminação de algum alimento da dieta da mãe só deve ser considerada se o bebê estiver apresentando reação alérgica ao leite materno.

Por fim, o mais importante é saber lidar corretamente com suspeitas de alergia em bebês. É essencial observar os sinais desde o seu início e buscar apoio profissional, já que com diagnóstico preciso — baseados em testes de pele, exames de sangue e, quando indicado, teste de provocação oral — é possível evitar restrições desnecessárias que podem comprometer a nutrição e o vínculo do aleitamento.

dicas práticas para quem suspeita de alergia no bebê:
  • Observe sinais: a aparição de sintomas como manchas vermelhas, coceira, inchaço, vômitos ou diarreia após a mamada.

  • Preste atenção à respiração: sons como chiados, tosse persistente ou dificuldade para respirar exigem avaliação imediata de profissionais qualificados dado a possibilidade de anafilaxia, o sintoma mais grave da alergia.

  • Registre o dia a dia: anote horários de mamadas, alimentos consumidos pela mãe desde o início do aparecimento dos sintomas e qualquer sintoma do bebê.

  • Mantenha amamentação exclusiva: evite fórmulas, água e chás nos primeiros seis meses, salvo indicação médica.

  • Busque orientação médica: consulte o alergista pediatra ao primeiro sinal de alergia; siga exames e testes indicados para a obtenção do resultado mais preciso possível.

  • Evite dietas maternas restritivas: Corte apenas o que for necessário com base em diagnóstico confirmado com um médico pediatra alergista, para não comprometer nenhum nutriente vital para o desenvolvimento infantil.

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